O meu outro eu

 

Quando eu era criança imaginava que existia outra Sâmia, perfeitamente idêntica a mim, em um outro mundo perfeitamente idêntico ao nosso. A única diferença entre nós duas, nessa minha fantasia infantil, eram as escolhas que fazíamos.

Explicando melhor: quando eu ficava em dúvida entre comer esse ou aquele bombom, e então fazia a minha escolha, tinha certeza que a outra Sâmia tinha optado pelo outro. Comia meu bombom imaginando quem havia sido mais feliz na decisão, imaginando o que a outra versão de mim mesma estava saboreando naquele mesmo exato momento.

Depois de adulta, descobri que alguns físicos teóricos sustentam uma teoria de multiverso, na qual o universo que habitamos não seria o único, mas haveria muitos outros, além do nosso. E que em uma das versões dessa teoria – pois há várias – mundos idênticos, com cópias idênticas de nós mesmos, realmente existiriam, separados por uma coisa chamada escolha. Seria como se todos os possíveis destinos que uma pessoa pode ter acontecessem “paralelamente” multiverso afora. Se isso fosse verdade, agora haveria sabe-se lá quantas versões de mim (e de vocês também) possivelmente exercendo profissões diferentes, em relacionamentos ou não, com ou sem filhos, morando em outros lugares. Algumas versões minhas poderiam até estar mortas, dado o meu histórico com acidentes (ui, que triste!).

Bem, se há mesmo muitas versões desse universo e de nós mesmos ou não, eu não sei. Mas uma coisa a gente sabe: poderíamos ter vivido vidas muitos diferentes aqui mesmo, desde que nascemos e começamos a tomar decisões. Afinal, o nosso caminho até os dias de hoje foi construído pelas nossas escolhas, algumas mais felizes e outras menos. E essa é a única coisa que tivemos a chance de experimentar: o resultado delas.

Mas o que poderia ter sido a minha vida, se eu tivesse optado diferente? Vira e mexe me pego pensando – inutilmente – sobre isso. Fico imaginando se, por caminhos diferentes, teria chegado quase sempre no mesmo lugar, ou se não, se ao invés disso, tivesse encontrado outras coisas valiosas, e descobertas que eu deixei de fazer. Será que eu teria chegado mais longe, teria explorado mais meu potencial? Será que eu teria sido mais feliz? Ou mais infeliz? Provavelmente todas essas respostas sejam possíveis. Mas em qual alternativa eu teria sido a melhor versão de mim mesma? Isso eu adoraria saber! Espero que depois de a gente partir dessa pra outra melhor/pior, alguém passe esse vídeo em algum telão do além...

Bem que a vida poderia ser como um jogo de vídeo game, no qual você falha, aprende com a falha e depois joga de novo e acerta, até ficar craque nele. Até sermos melhores jogadores no jogo do nosso destino. Mas a vida não é assim. Na verdade, acordamos todos os dias sem saber muito sobre o que aproveitamos e descartamos de tudo o que nos é oferecido em nossos caminhos.

O filme “De Caso com o Acaso”, ou “Sliding Doors” de 1998, especula bastante sobre isso. A história nos mostra como um simples atraso muda a vida de uma personagem, que a partir dele, tem seus dois destinos narrados: aquele em que ela pega o metrô na hora certa e aquele em que ela perde o metro e muito mais do que isso sai fora da sua programação.

Outro filme bacana com esse tema, sem dúvida, é "Corra, Lola, Corra",  no qual vemos uma personagem correndo contra o relógio para resolver um problema urgente, de maneiras diversas e com consequências bem surpreendentes.

 

 

A cada sim e não, a cada “acaso” ou decisão, um desdobrar de eventos diferente se desenrola em nossas vidas. E por mais que nos angustie não saber se somos protagonistas da nossa melhor história, talvez isso nem importe. Talvez passaríamos pelas mesmas provações em todas elas, apenas de formas diferentes. Talvez o essencial esteja na forma como lidamos com a vida e não no que ela é. Talvez a nossa melhor versão sempre tenha a chance de existir em toda essa variedade. Talvez, talvez, talvez...